Nesta entrevista exclusiva, Eliseu Martins, professor emérito e ex-diretor das Faculdades de Economia, Administração e Contabilidade dos campi de São Paulo e Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP), membro de conselhos de administração, consultivos e fiscais de empresas privadas, estatais e de entidades sem fins lucrativos, e de conselhos editoriais de renomadas revistas técnicas da área contábil, compartilha sua perspectiva sobre o cenário atual da profissão contábil no Brasil e no mundo e sobre as próximas fronteiras do processo de convergência das Normas Brasileira de Contabilidade aos padrões internacionais.
Professor Eliseu Martins: O cenário é de grandes transformações, como decorrência da aceleração da inovação tecnológica. Cada vez mais a rotina é substituída por máquinas, com um custo menor e qualidade melhor. A profissão, incluindo os professores, tem que se adaptar melhor e mais rapidamente para essa nova nova era, que é inexorável. Aliás, esse processo já iniciou há muito tempo. É só olhar a mudança na quantidade de pessoas nas contabilidades das empresas e dos escritórios de contabilidade. A mudança por conta da tecnologia não virá, já começou.
CRCPR Online: Quais desafios o profissional deve estar preparado para enfrentar? Como os profissionais podem se adaptar a essa nova realidade?
EM: O profissional que não só vai sobreviver, como também irá se sobressair, será aquele que dirigir seus conhecimentos e sua atenção para funcionar como apoio forte à gestão. E daí não é suficiente ser bom em contabilidade. É necessário saber bem mais sobre tecnologia, sobre economia, sobre administração, sobre finanças, sobre direito. O profissional isolado na empresa está em extinção. Precisa saber se comunicar, saber se comportar frente às mais dramáticas situações, saber entender seus pares, seus subordinados e seus superiores (soft skills). Assim, um olho na contabilidade e o outro procurando oportunidade, se estiver bem preparado, para ser ou ser mais ainda, um auxiliar de enorme importância para a gestão. Para isso precisa entender de gestão, dessas linguagens comentadas, para verificar que tipos de informação a empresa precisa para se aprimorar no seu processo decisório. Esse é, no meu entender, o grande futuro da profissão.
"É fantástico ver o que melhorou a atuação e a imagem do profissional de contabilidade nas grandes, e em determinadas médias empresas. O profissional, que ficava o dia todo sentado na sua cadeira, agora procura informações e dialoga com a empresa toda, é bastante demandado por outras áreas e também pela alta gestão. Mudou completamente seu papel."
CRCPR Online: Quais são as próximas fronteiras a serem desbravadas rumo à convergência das normas contábeis brasileiras aos padrões internacionais?
EM: A grande aderência às normas internacionais está feita, agora são só melhorias e alguns pontos novos a cada um ou dois anos. O grande problema brasileiro é que, se por um lado as IFRS tomaram conta das grandes, e muitas médias empresas, as pequenas ainda não (e certas médias também não). Talvez seja necessário o que o CFC está pretendendo: criar um quarto nível para a contabilidade, inferior à do CO CPC PME, mas bem melhor do que a atual ITG 1000. O degrau ficou alto demais para a empresa sair da ITG 1000 e passar para a norma de pequenas e médias empresas. Ou seja, o processo de adoção das normas internacionais passaria por um outro degrau que consideramos importante. Agora, com relação às fronteiras das normas internacionais em si, talvez não haja tanto mais para se evoluir, mas só a vivência futura irá determinar isso. Acredito muito mais em saneamento de dúvidas do que de grandes inovações.
CRCPR Online: Na sua opinião, o que o processo de convergência às IFRS trouxe de positivo e de negativo ao ambiente empresarial brasileiro e aos profissionais da contabilidade?
EM: É fantástico ver o que melhorou a atuação e a imagem do profissional de contabilidade nas grandes, e em determinadas médias empresas. O profissional, que ficava o dia todo sentado na sua cadeira, agora procura informações e dialoga com a empresa toda, é bastante demandado por outras áreas e também pela alta gestão. Mudou completamente seu papel. Deveria isso estar acontecendo com empresas menores, mas não está no mesmo ritmo. Mas é muito sensível o desenvolvimento, inclusive de escritórios de contabilidade preocupados com uma contabilidade de alta qualidade, e principalmente com o objetivo de funcionarem como fonte de consulta e de sugestões para a gestão empresarial. De negativo, talvez tenha trazido a evidenciação de como boa parte de nós, profissionais, ainda não estamos preparados para essa nova função da contabilidade. Talvez as IFRS tenham também trazido enfoque total à contabilidade para usuários externos, e tenha-se perdido de vista a contabilidade gerencial, para usuários internos. Por isso sugiro fortemente: o maior futuro da contabilidade parece estar naquela que é desenvolvida para a gestão. Na procura de quais informações, inclusive fora do formato das IFRS, são as necessárias à administração. Precisamos enfocar mais a contabilidade gestorial; a para usuários externos, credores e investidores, por exemplo, já está bem desenvolvida.
O objetivo da Convenção é promover aprimoramento profissional, científico e cultural dos agentes da contabilidade em diversos públicos como profissionais, professores e estudantes de contabilidade. A Convenção é realizada pelo Conselho Regional de Contabilidade do Paraná (CRCPR), com o apoio de Federação dos Contabilistas do Estado do Paraná (FECOPAR), Academia de Ciências Contábeis do Paraná (ACCPR), SESCAP*-PR, SESCAP*- Campos Gerais e SESCAP*- Londrina.
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* SESCAP - Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas no Estado do Paraná (SESCAP-PR)
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